Tema de debate não só no meio jurídico, a ética – valores morais individuais ou coletivos – vem sendo colocada em xeque há tempos no Brasil. Há milhares de livros sobre o assunto e seria necessário talvez, outros milhares deles para exemplificar casos e casos, como diz o jargão jurídico. Em Avaré, os últimos acontecimentos que envolvem o Legislativo dariam ótimos livros de horror e comédia (para não dizer tragédia).
De tudo, o desrespeito às leis e o servilismo tem sido marcas da atual Câmara Municipal, comandada por vereadores da base governista. Além de afrontar os eleitores, alterando regimento interno de forma indevida, desprezando a opinião pública, a atual mesa diretora do Legislativo parece agir acima da lei. Na penúltima sessão de agosto, por exemplo, passou por cima do regimento ao permitir a fala de um secretário do governo sem colocar previamente na pauta, como determinado.
A permanência da comissionada Ádria Luzia Ribeiro de Paula como diretora do Legislativo – apesar das denúncias – intriga os eleitores. Recentemente o Ministério Público do ESTADO de São Paulo, através da Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos, acatou ação da Ong Vigilantes da Gestão Pública e pediu o afastamento da atual diretora do Legislativo. O parecer emitido tem como agravados não apenas Adria, mas também toda mesa diretora: Flavio Eduardo Zandona, Roberto de Araújo, Ana Paula Tibúrcio de Godoy e Carla Cristina Massaro Flores.
A Ong afirma que a nomeação da diretora está em desacordo com a Lei Municipal nº 1.787 (2014), que em seu artigo 1º proíbe a “nomeação para qualquer cargo de provimento em comissão no âmbito da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo, do Poder Legislativo e Fundacional, de quem tenha condenação transitada em julgado pela prática de situações descritas pela legislação eleitoral conforme art. 1° da Lei Complementar n° 64/1990 e suas alterações, configurem hipóteses de inelegibilidade”.
Ádria, que chegou a ser candidata a vice-prefeita ao lado do então candidato Joselyr Silvestre em 2012, foi condenada em primeira e segunda instâncias por improbidade administrativa quando foi secretária de esportes em 2008 por ter criado um “orçamento paralelo” na época, através da locação de equipamentos públicos municipais (quadras de esportes dos ginásios municipais) e cujos valores eram contabilizados em caixa próprio.
Para o MP neste caso, não se discute apenas a suspensão dos direitos políticos em decorrência de condenação definitiva, mas a ausência de idoneidade moral para ocupar cargo público, quanto mais o de Diretor Geral Administrativo da Câmara Municipal de Avaré. “ A nomeação de pessoa condenada por ato de improbidade, confirmado em segundo grau, viola o princípio da moralidade, havendo indício de ferimento também ao princípio da impessoalidade”, reforça o procurador, lembrando que a agravada interpôs recurso extraordinário que há sete anos.
O procurador reforça que enquanto o parecer não for julgado, Adria continua receber verbas públicas indevidamente (seu salário atual é de mais de 11 mil reais), “onerando indevidamente o erário e acometendo de nulidade/anulação seus atos administrativos. Ou seja, quanto mais tempo se prolongar a nomeação da Agravada, mais o erário arcará com despesas indevidas, as quais dificilmente serão reavidas, caracterizando-se o periculum in mora típico das ações que envolvem discussão acerca de improbidade administrativa”.
E é isso que vem acontecendo e de forma irregular. A diretora do Legislativo tem hoje um dos maiores salários (ultrapassa 11 mil reais ) graças a gratificações que na verdade, não lhe seriam devidas. Só em julho, ela recebeu mais de R$ 1,7 mil em gratificações FE3. O problema é que como comissionada esse recebimento seria irregular. O artigo 31 da resolução n° 386/2014 que trata da remuneração dos servidores, entre outros itens, afirma que “as designações serão efetuadas por meio de Ato da Mesa Diretora”, mas em seu parágrafo único, frisa que “ (…) As disposições desta sessão não se aplicam aos cargos de Assessoria Parlamentar”.
De fato, juristas consultados pelo in Foco são unânimes em afirmar que apesar de controverso, o pagamento de adicional por comissionado em funções de chefia, assessoramento e direção fere a legislação. Há vários pareceres tanto do CNJ quanto de vários tribunais neste sentido, de que não é possível a acumulação de remuneração de cargo em comissão com gratificação. Apesar disso, ato da mesa de maio deste ano, concedeu gratificação a Ádria e a outros dois servidores para ajudarem na CPI que investiga a compra suspeita de medicamentos.
O ex-presidente do Legislativo Toninho da Lorsa confirmou que a atual diretora nunca recebeu anteriormente gratificações em seu mandato. “Assim que entrei cortei todas as gratificações de cargos comissionados”, disse. Em maio de 2018, o então presidente promoveu Ádria ao cargo de diretora, mas reafirma que nunca pagou gratificação – o que é confirmado pelo Portal da Transparência. Na gestão passada foram realizadas duas CPI’s e uma CP e ela teria trabalhado em todas sem receber a mais por isso. Até quando vão ocorrer ingerências como essa só o tempo dirá e a justiça também.