O número de ciclistas amadores e profissionais tem aumentado em todo o país e com ele, também o número de acidentes. Em Avaré, a situação não é diferente; grupos de ciclistas se reúnem para percorrer vias urbanas, por vezes muito movimentadas, além de estradas vicinais e rodovias.

O problema é que o risco que isso representa, já que em muitos casos não há bom senso seja de motoristas ou ciclistas – o que predispõe a acidentes e pode criar um péssimo cenário para possíveis tragédias.

A morte relativamente recente da campeã paulista de ciclismo Lais Saes, que morreu atropelada enquanto treinava na Serra da Canastra, em Divinópolis (MG) é um exemplo que ilustra a situação. Ela, que foi a primeira mulher a pedalar a subida do Pico do Jaraguá, ponto mais alto da cidade de São Paulo, foi atropelada por carro de trilha (utv) enquanto pedalava em uma estrada de terra.

O ciclismo de estrada é um dos mais praticados, mas também que pode oferecer maiores riscos justamente por não haver sinalização ou condições ideais para a prática.

Nas ruas, ciclistas que escolhem vias movimentadas, acabam aumentando a tensão do trânsito que não tem espaço necessário para carros, motos e até corredores. Além disso, a péssima iluminação pública e o estado precário das vias esburacadas só contribui para um desafio de todos que trafegam pelas ruas, independente do meio de locomoção.

Nas rodovias, por vezes equipes inteiras ocupam faixas inteiras disputando espaço com veículos e caminhões, colocando-se em potencial risco, assim como os motoristas também.

Segundo o Código de Trânsito, se não houver acostamento nas rodovias isso é proibido. Mas mesmo com acostamentos (que não são usados) a hipótese de acidentes infelizmente é grande.

A falta de campanhas de conscientização é um dos principais motivos de acidentes envolvendo veículos e ciclistas – campanhas que inexistem em Avaré. Além disso, falhas do ciclista (perda de controle, inexperiência, realização de acrobacias e alta velocidade), problemas mecânicos na bicicleta e alta velocidade dos veículos são outros fatores agravantes.

 

Dados – O Ministério da Saúde divulgou recentemente os números consolidados de mortes no trânsito brasileiro em 2021. Segundo a estatística, morreram 33.813 pessoas em decorrência do trânsito brasileiro. O número é aproximadamente 3,4% maior que o registrado em 2020. Analisando os dados existem detalhes que chamam a atenção e um deles se refere às informações sobre ciclistas mortos no trânsito brasileiro.

Outra informação que chama a atenção é que em todos os anos, desde 2016, a faixa etária mais atingida entre os ciclistas mortos no trânsito está entre 50 e 59 anos. Também é um perfil diferente do que se verifica nos números gerais.

Conforme Flávio Emir Adura, médico do tráfego e diretor científico da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), as vítimas ciclistas, que em 1996 representavam 0,9% do total dos óbitos no trânsito brasileiro, elevaram-se para 3,5% em 2020.

“Devido à pandemia da Covid-19, registraram-se altas históricas na frota circulante de bicicletas. Uma vez que, com o isolamento social e a necessidade de evitar aglomerações no transporte público, a bicicleta passou a ser mais utilizada como veículo de passeio para o lazer e esporte. Além disso, para deslocamentos em direção ao trabalho e estudo, transporte de cargas (mercadorias, correspondências e outros) e até como veículo para transporte de pessoas na condição de passageiros”, analisa.

O médico aponta alguns fatores de risco de sinistros que foram agravados pós pandemia. “Condições médicas, medicamentos, fadiga, sono e uso de substâncias psicoativas (drogas) são também importantes causas de acidentes de trânsito”, explica Adura.

Para reverter esse quadro, de acordo com o diretor da Abramet é preciso reforçar estratégias de policiamento e fiscalização nas vias. “Além disso, criar e aplicar legislação abrangente para a segurança no trânsito”, finaliza.

Outros dados mais atualizados do MS mostram que mais de 260 mil internações hospitalares foram registradas no ano passado na rede pública por sinistros de trânsito. O levantamento da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) aponta que 76% desses casos envolveram pedestres, ciclistas e motociclistas.

Desde 2014, mais de 2,2 milhões de atendimentos foram realizados no Sistema Único de Saúde (SUS) para tratamento de pessoas envolvidas em sinistros graves de trânsito. E, ao longo dos anos, os casos com grupo mais exposto nas ruas cresceram:

  • Pedestres: apesar de uma queda inicial até 2020, as internações voltaram a crescer, com pico de 39.125 em 2023.
  • Ciclistas: crescimento constante ao longo da última década, de 9.238 em 2014 para 15.573 em 2023.
  • Motociclistas: aumento contínuo ao longo da série e o grupo mais afetado. Apenas em 2023, foram mais de 141,7 mil internações.

“Os dados destacam a urgência de medidas preventivas focadas na educação e infraestrutura de trânsito que protejam especialmente esses usuários mais expostos”, pondera o presidente da Abramet, Antonio Meira Júnior.

Entre 2013 e 2022, pedestres, ciclistas e motociclistas são os grupos com maior casos de mortes. Segundo a pesquisa, apesar de uma tendência geral de declínio nos óbitos relacionados ao trânsito, esses grupos continuam a enfrentar riscos desproporcionais: metade de todos os registros de óbitos a cada ano.

 

Afinal, trânsito de bicicletas em rodovias, pode ou não pode?

O CTB (Código de Trânsito Brasileiro) prevê a circulação de bicicletas em rodovias (vias rural pavimentada), desde que se trata de pista dupla e haja acostamento ou faixas de rolamento próprias, com algumas considerações:

Art. 58. Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores.

Dessa forma, entende-se que a circulação de bicicletas é prevista no CTB, devendo os ciclistas se utilizarem de acostamentos ou, quando não os houver ou não for possível a utilização, os bordos da pista, no mesmo sentido de circulação do trânsito e com preferência sobre os veículos automotores.

 

A rodovias se incluem no rol das vias rurais, pelo disposto no art. 60, inciso II, alínea a do CTB:

Art. 60. As vias abertas à circulação, de acordo com sua utilização, classificam-se em:

I – vias urbanas: a) via de trânsito rápido; b) via arterial; c) via coletora; d) via local;

II – vias rurais: a)rodovias;b) estradas.

Inclusive, o próprio Anexo I do CTB – que trata das definições – prevê no contexto de “acostamento” a circulação de bicicletas:

 

ACOSTAMENTO – parte da via diferenciada da pista de rolamento destinada à parada ou estacionamento de veículos, em caso de emergência, e à circulação de pedestres e bicicletas, quando não houver local apropriado para esse fim.

Vale ressaltar que o Mesmo Anexo I do CTB traça a distinção entre estrada e rodovia, tratando-se a primeira de “via rural não pavimentada” e a última de “via rural pavimentada”.

Mais à frente, o CTB ao tratar das infrações, no disposto no Parágrafo 1º, alínea b do art. 244, tem-se manifestada a vedação de transitar em rodovias, salvo onde houver acostamentos ou faixas apropriadas para essa finalidade:

 

Art. 244. Conduzir motocicleta, motoneta e ciclomotor:

  • 1º Para ciclos aplica-se o disposto nos incisos III, VII e VIII, além de:
  1. b) transitar em vias de trânsito rápido ou rodovias, salvo onde houver acostamento ou faixas de rolamento próprias;

Pela própria definição, entende-se que “ciclos” se refere a um grupo do qual fazem parte as biclicletas.

No mesmo Anexo I são assim definidos: “CICLO – veículo de pleno menos duas rodas a propulsão humana” e “BICICLETA – veículo de propulsão humana, dotado de duas rodas, não sendo, para efeito deste código, similar à motocicleta, motoneta e ciclomotor”.

Muito embora o art. 58 do CTB pareça permissivo no sentido de permitir a circulação de bicicletas em “via rural de pista dupla”, pela própria definição, tem-se que a rodovia se enquadra como “via rural pavimentada”, representando um tipo mais específico de via rural.

Desse modo, pela lógica da redação legislativa, possível concluir que a circulação de bicicletas é permita em rodovias desde que haja acostamento ou faixa de rolamento apropriada para o trânsito dos ciclistas. É isso!

 

Fontes JusBrasil, CNN, G1