No dia 29 de dezembro, publicamos matéria falando sobre as mais de 18 mil pessoas que ainda não tomaram segundas ou terceiras doses da vacina contra o coronavírus em Avaré. Uma adolescente – L.V.O – menor de idade, fez inúmeros comentários e postagens de links que apontavam o “risco” na vacinação em adolescentes.

A grande maioria dos comentários e apontamentos da adolescente são fakes news, o que comprova que as falsas notícias não são espalhadas apenas por pessoas mais velhas. A jovem chega a dizer que o jornal estaria sendo “omisso” em relação a divulgação dos “fatos” apresentados por ela. “Tem a probabilidade de morrer de ataque cardíaco e mesmo assim vocês querem vacinar? Uau. Pois tem pessoas morrendo com essa vacina; tem que pensar duas vezes antes de tomar isso, pois não tem como dizer que “a tem mais prós do que contras”, afirma a internauta.

Uma das postagens falta que “adolescentes vacinados contra Covid-19 não têm 6 vezes mais chances de problemas cardíacos”. Outra, trata o mesmo tema reforçando os “riscos de miocardite e periocardite após tomar vacinas pela Anvisa”. Ambas fakes são de junho de 2021 e portanto não foram atualizadas.

Todas estas fakes já circularam por WhatsApp e são “baseadas”  numa “pesquisa conduzida nos Estados Unidos, tem sido usada para desestimular a vacinação de jovens, já que contrair o covid supostamente seria menos arriscado do que buscar a imunização”(veja detalhadamente abaixo).

Ano passado, a Anvisa de fato emitiu em setembro uma nota técnica sobre o assunto, na qual afirma que “é importante evidenciar que o risco/benefício da vacina é altamente favorável, uma vez que o risco da doença COVID-19 na ausência da vacinação e o desenvolvimento de formas graves é maior do que a baixa probabilidade da ocorrência de um EAPV. Além disso, os episódios de miocardite/pericardite, com provável associação à vacina ocorreram de forma leve e com boa evolução clínica. Assim, mantém-se a recomendação de vacinação”.

Veja a nota na íntegra no link abaixo.

https://sbim.org.br/images/files/notas-tecnicas/nt-pericardite-miocardite-eapv-covid19.pdf

 

Afinal, a vacinação de adolescentes é segura?

Sim, diversos órgãos e sociedades médicas já reforçaram que a vacinação é, sim, segura para pessoas com 12 anos ou mais. Inclusive, diversos países estão vacinando seus adolescentes e crianças, como os EUA, a França e a Alemanha.

Em nota, a OMS (Organização Mundial de Saúde) afirmou que a vacina da Pfizer/BionTech é segura para pessoas com 12 anos ou mais e que jovens dentro dessa faixa etária e com alto risco (que têm comorbidades) devem receber a vacina junto com os outros grupos prioritários.

A OMS também esclarece que a prioridade deve ser o público mais velho, com doenças crônicas e os profissionais de saúde, pois “as crianças tendem a ter uma doença mais branda em relação aos adultos”. Ou seja, a OMS nunca disse que não disse que não é seguro vacinar adolescentes sem comorbidades, a instituição apenas considera menos urgente vaciná-los.

Por fim, o órgão também afirma que mais evidências sobre outras vacinas neste público são necessárias para fazer recomendações gerais.

O Ministério da Saúde chegou a recomendar a suspensão da vacinação ano passado, mas até a  SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) se manifestou contra o recuo da pasta em relação à vacinação de adolescentes sem comorbidades após o anúncio do início da vacinação desse grupo. “A medida gera receio na população e abre espaço para fake news”, diz o posicionamento.

No texto, eles trouxeram diversas justificativas para mostrar que a medida não é a adequada. Uma delas é que a vacinação já foi autorizada pelo Ministério da Saúde no capítulo 3.1 da Nota Técnica no dia 02 de setembro de 2021, e no capítulo 4.3.3.2 da 10ª edição do PNO (Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a covid-19), de 15 de agosto de 2021.

A SBIm esclareceu na época, que o fato de apenas um imunizante — o da Pfizer — ter sido testado em ensaios clínicos randomizados e licenciado pela Anvisa para uso em pessoas a partir dos 12 anos, e ocorrências pontuais de administração equivocada de vacinas de outros fabricantes (erros de imunização) não justificam a interrupção.

Ainda na nota da SBIm, eles explicam que a incidência de eventos adversos graves como miocardite (16/1.000.000 de pessoas que recebem duas doses da vacina) é extremamente baixa e inferior ao risco da própria covid-19. Os casos, portanto, não são apenas raros como praticamente todos eles são leves —o que não justificaria a pausa na vacinação para esse grupo. Dados muito recentes mostram o seguinte: observando os meninos e meninas entre 12 e 17 anos que sempre foram saudáveis, mas que vão parar no hospital, precisar de UTI e eventualmente morrer por causa da infecção pelo Sars-CoV-2, esse número é muito maior do que o de casos de miocardite pós-vacina entre eles.

Até dia 15 de dezembro pelo menos 80% dos adolescentes brasileiros (12 aos 17 anos) estavam vacinados com a primeira dose da vacina da covid-19 e 25% do total já estão com o regime completo, de acordo com números do Ministério da Saúde. Para especialistas, a cobertura é muito boa, comparável à de poucos países, como Estados Unidos, Reino Unido e Canadá.

Fake

A informação  sobre risco de doença cardíaca já havia sido analisada pela agência Lupa e é falsa. O estudo mencionado foi publicado em formato pré-print, ou seja, ainda precisa passar pela revisão de outros cientistas. Com isso, não é possível chegar a qualquer conclusão sobre o assunto usando essa pesquisa. Além disso, especialistas apontaram falhas na metodologia adotada, que se baseia nos dados de um sistema de notificação de eventos adversos – plataformas com essa característica não podem ser usadas para essas análises, porque os relatos ainda precisam ser investigados.

O estudo em questão foi publicado em 8 de setembro no medRxiv, uma plataforma voltada a pré-prints. Assinam o texto quatro pesquisadores norte-americanos, incluindo uma cientista da Universidade da Califórnia. A análise baseou-se em dados de adolescentes entre 12 e 17 anos informados de janeiro a julho ao Sistema de Notificação de Eventos Adversos de Vacinas (Vaers, na sigla em inglês), dos Estados Unidos.

Os pesquisadores buscaram na base de dados do Vaers, dentro do público-alvo estabelecido, os termos “miocardite”, “pericardite” e “miopericardite”, que são formas de inflamação do coração, além de “dor no peito”. O termo “troponina”, que é uma enzima ligada à lesão miocárdica, era obrigatório no filtro da busca. Dessa forma, o estudo chegou a 257 eventos cardíacos adversos notificados à plataforma.

Como conclusão, os pesquisadores apontaram que garotos entre 12 e 15 anos sem comorbidades e que receberam a segunda dose da vacina contra a Covid-19 têm de 3,7 a 6,1 vezes mais risco de enfrentarem eventos cardíacos adversos do que serem hospitalizados com a Covid-19. Os imunizantes mencionados são os que usam a tecnologia do RNA mensageiro, como Pfizer e Moderna.

A plataforma medRxiv, que divulgou o pré-print, reforça que os trabalhos ali publicados ainda precisam ser revisados por pares: “Os artigos relatam novas pesquisas médicas que ainda não foram avaliadas e, portanto, não devem ser usadas para orientar a prática clínica”.

Uma reprodução do título de um artigo do periódico The BMJ, do Reino Unido, que discutia o estudo, circulou nas redes sociais brasileiras. No entanto, dias depois de publicado, o título foi alterado, ressaltando que o artigo norte-americano é “profundamente falho” na avaliação de  especialistas que o analisaram.

Os cientistas advertiram que os dados que embasaram o estudo foram coletados de uma fonte inapropriada, com o intuito de entregar uma mensagem antivacina. A plataforma Vaers – que está vinculada ao Centro para o Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) e ao Food and Drug Administration (FDA), agência norte-americana de regulação de alimentos e medicamentos – coleta relatos de reações adversas que qualquer pessoa tenha observado após receber uma vacina. Esses relatos não foram necessariamente investigados, nem é possível estabelecer uma relação direta entre eventuais efeitos adversos e as vacinas. O próprio sistema avisa que as notificações podem conter “informações incompletas, imprecisas, coincidentes ou não-verificáveis”.

As informações são coletadas pelo Vaers para que as autoridades reguladoras consigam monitorar os efeitos das vacinas e eventualmente reconsiderem suas autorizações para uso, caso julguem necessário.

Em junho de 2021, o CDC reconheceu a existência de uma “ligação provável” entre casos de miocardite e pericardite e jovens de até 30 anos que receberam a segunda dose da vacina contra a Covid-19. No entanto, o órgão ressaltou que esses casos são geralmente leves e extremamente raros. Além disso, reforçou que essas consequências são muito mais comuns ao se contrair a Covid-19, e que os riscos ao coração causados pelo vírus podem ser mais severos.

A vacinação de adolescentes contra a covid-19 no país tornou-se um assunto polêmico. Apesar de ser autorizada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e considerada segura pela OMS (Organização Mundial de Saúde), a imunização de pessoas com idade entre 12 e 17 anos sem comorbidades foi suspensa pelo Ministério da Saúde, na semana passada.

Segundo nota técnica, a decisão estaria embasada na recomendação da OMS em não imunizar esse grupo, pelo número baixo de casos graves e pelos poucos estudos sobre a vacinação nessa faixa etária. Além disso, o ministro Marcelo Queiroga justificou a medida afirmando que os estados não estavam seguindo o PNI (Plano Nacional de Imunização) e aplicaram em adolescentes outras vacinas além da Pfizer —a única autorizada pela Anvisa para esse grupo—. Ainda citou que ocorreram eventos adversos nesse público que precisam ser avaliados.