Uma representação de irregularidades envolvendo a Câmara Municipal de Avaré virou Ação Direta de Inconstitucionalidade e acabou gerando a suspensão de abono natalino aos servidores do Legislativo.
Isso porque o relator Ferreira Rodrigues, do Tribunal de Justiça do Estado de SP deferiu liminar “para suspender a eficácia da norma impugnada até decisão definitiva “, atacando pedido do Ministério Público.
A representação do MP foi apresentada em julho deste ano contra a Câmara Municipal, questionando o pagamento que estaria previsto num ato da mesa . O MP chamou o abono de “benesse remuneratória instituída ao arrepio dos princípios constitucionais da moralidade, da razoabilidade, da finalidade e do interesse público”.
“A concessão de abono de Natal aos servidores públicos não se compatibiliza com os princípios da moralidade, razoabilidade, finalidade e interesse público. Comemoração de Natal não caracteriza fato gerador legítimo ao direito à percepção de vantagem remuneratória. A definição do valor da benesse não pode ser deixada a critério do Poder Legislativo. Logo, é de rigor a proclamação da inconstitucionalidade da Lei n. 2.698, de 05 de julho de 2022, da Estância Turística de Avaré”, diz a representação.
No documento o Procurador-Geral de Justiça Mário Luiz Sarrubbo afirma que o ato normativo não tinha indicação de qualquer valor e que se equivale ao décimo quarto salário, não atendendo nenhum interesse público ou exigências do serviço.
“Não é a Administração Pública fonte de mordomias ou favores aos seus servidores. Atenta contra a impessoalidade, sob os vetores de igualdade e finalidade, a instituição de benesses que não são extensivas aos trabalhadores e são instituídas em razão de discriminação intolerável baseada na condição de servidor público. Sua instituição atende apenas o interesse dos servidores públicos. É discrepante da razoabilidade. Não atende ao bom senso, nem à proporcionalidade. Tampouco é necessária. Ao contrário, implica ônus excessivo ao erário (…) Logo, é de rigor a proclamação da inconstitucionalidade da Lei n. 2.698, de 05 de julho de 2022, da Estância Turística de Avaré”, pede o procurador.
Como surgiu a polêmica?
Em dezembro de 2021 uma denúncia anônima feita ao Ministério Público (MP) afirmava que a diretora do Legislativo Ádria de Paula havia recebido mais de 25 mil reais de salário, acima do teto definido por lei; no caso de Avaré o recebimento de 18 mil reais por parte do prefeito Jô Silvestre (PSDB) não deve ser ultrapassado.
Em março deste ano, a jornalista do in Foco Cida Koch questionou junto ao Legislativo e também ao MP local a legalidade do pagamento tendo em vista que o ato que o instituiria (52/2021) não estava no portal. Até hoje, a Câmara Municipal não retornou sobre o pedido, mas no processo o ato é finalmente publicado. A diretora inclusive processou a jornalista por danos morais e queria que fosse proibida de divulgar seu salário, mas a justiça não acatou o pedido.
“Por meio de procedimento instaurado nesta Promotoria de Justiça, a partir de manifestação anônima tomou-se conhecimento de que a Câmara de Vereadores da Estância Turística de Avaré, em dezembro de 2021, concedeu, por meio do Ato da Mesa nº 52/2021, abono de natal a todos os servidores da Casa de Leis, com fundamento no artigo 49 da Resolução nº 441/21. Considerando que referida gratificação não pode ser concedida por meio de Resolução, exigindo-se lei de iniciativa do próprio Poder Legislativo, a ser submetida à sanção ou veto do Poder Executivo, restando violadas, portanto, as disposições contidas nos artigo 128 e 144 da Constituição Estadual, REPRESENTO a Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 90, III da Constituição do Estado de São Paulo; artigos 25, I e 29, I e II da Lei nº 8.625/1993 e artigos 103, II a V e 116, VI e VII da Lei Complementar Estadual nº 734/1993, para fins de propositura de ação direta de inconstitucionalidade, em razão da violação aos artigos 111, 128 e 144, todos da Constituição Estadual, pela Câmara de Vereadores da Estância Turística de Avaré”, oficiou a Promotora de Justiça Gilmara Cristina Braz de Castro.
Em sua defesa inicial, o presidente da Casa Flávio Zandoná (Cidadania) alegou que tem sido criticado injustamente através de representações infundadas e vítima de “ofensas pessoais e políticas perante este órgão”, argumentando que tudo não passaria de perseguição política.
Depois da manifestação inicial do Ministério Público, Zandoná resolveu anular o ato da mesa e manter o abono através de outra lei.
“Ao receber a presente Representação, achou por bem a este Presidente juntamente com a Mesa Diretora, com base no princípio da autotutela em que a Administração Pública exerce controle sobre seus próprios atos, tendo a possibilidade de anular os ilegais e de revogar os inoportunos. Isso ocorre, pois a Administração está vinculada à lei, podendo exercer o controle da legalidade de seus atos. Optou, a Mesa Diretora, por revogar o artigo 49 da Resolução nº 441/2021 e proceder à concessão do abono de Natal através da Lei nº 2698/2022”, afirmou em sua defesa
Até mesmo o Tribunal de Contas do Estado (TCE) se manifestou neste caso. Depois de revogar o artigo 49 da resolução 441 para manter o abono de natal (embora os servidores já recebam obviamente 13º) também foi questionado pela justiça e por fim, atrelou o pagamento à lei 2698, de julho deste ano. Mas, por enquanto o benefício está suspenso por ordem judicial.
Trechos do processo