Parece estranha a pergunta, mas foi precisamente a ela que o cientista Marc-Antoine Fardin tentou responder, explicando propriedades reológicas dos gatos para perceber se eles se comportam como um líquido, um sólido ou ambos. Historicamente, a definição de sólido, líquido ou gás dependiam apenas de avaliações qualitativas, onde os sólidos eram capazes de manter volumes e formas constantes ao longo do tempo, os líquidos mantinham o volume e adquiriam a forma do recipiente onde estavam contidos e o gás expandia para ocupar todo o volume que tinha disponível. A questão que se coloca é se os gatos podem realmente ser líquidos à luz destas definições.

Os gatos são capazes de ocupar a forma do recipiente onde se encontram; além disso os gatos mais velhos apresentam um tempo de relaxação mais curto, o que faz com que mais facilmente se tornem líquidos comparativamente aos gatos mais jovens.

E não é que essa dúvida acabou virando a questão mais fofa de uma Fuvest ? A curiosidade foi tema de reportagem da revista Superinteressante. De acordo com a matéria, um estudioso do estado físico da matéria felina levou o prêmio-paródia Ig Nobel (uma paródia do Nobel, para quem não conhece).

Mas ora bolas! Afinal, gatos estão no estado sólido ou líquido? “Sólido”, responderá você– principalmente se tiver um bichano em casa e pode apertá-lo para verificar. Acontece que a Wikipédia discorda: “um líquido é um fluído quase incompressível que se conforma ao formato de seu recipiente, mas retém um volume quase constante”, diz a edição anglófona da enciclopédia online colaborativa. E o gato abaixo claramente se encaixa nessa definição. Há até um segmento do felino – a cauda, talvez? Difícil saber – escorrendo pela boca do pote.

“Não dá para confiar na Wikipedia”, você dirá. Bem, você está certo. Acontece que não foi uma fonte qualquer que mencionou a aplicação felina da reologia (isto é, o estudo das deformações e escoamentos da matéria). Na verdade, foi a 1ª fase do vestibular 2019 da Fuvest, que dá ingresso à Universidade de São Paulo (USP), uma das melhores instituições de ensino superior do País. A prova trouxe essa questão e a resposta correta foi a “B”: os gatos, como todos os mamíferos, têm volume variável (é possível apertá-los) e forma constante. Mas são tão flexíveis e peludos que passam a impressão oposta: volume constante e forma variável.

Foi isso que levou Marc-Antoine Fardin, físico da Universidade Paris Diderot, na França, a se perguntar se seria possível estudar a aparente fluidez dos gatos a partir da reologia – a já mencionada área da física que se dedica a estudar a deformação e escoamento da matéria. Para deixar bem claro: Fardin estudou o fenômeno felino de fato, usando equações e os demais artifícios da caixa de ferramentas de um cientista.

Ele escreveu sobre o assunto no site The Conversation (que fornece textos de divulgação científica em domínio público). Em suas palavras: “No cerne da definição de líquido está uma ação: um material precisa ser capaz de modificar sua forma para se moldar a um recipiente. Essa ação precisa ter uma duração característica – que na reologia se chama tempo de relaxamento. Determinar se algo é ou não líquido depende se você observou o fenômeno por um período de tempo que é maior ou menor que o tempo de relaxamento.” Independente da resposta, eles são muito fofos e desafiam as leis da física!

 

(Fontes Bruno Vaiano, Superinteressante, Rheologye Fuvest 2019, primeira fase/Reprodução)