Além do projeto de aumento de salário para a vice-prefeita Bruna Silvestre, a Câmara Municipal aprovou por unanimidade projeto de lei cedendo uma área pública à empresa JC Prestação de Serviços Ltda.

Seria apenas mais uma concessão a uma empresa que promete gerar empregos e renda, se não fosse por um detalhe importante: a área doada é aquela do polêmico depósito de amianto, uma novela que se estende por anos e a empresa assumiu a responsabilidade de retirar o produto que é cancerígeno. Até por determinação judicial, essa seria a única forma de doação. Contudo, o que não se sabia é que no dia 31 deste mês, venceria o prazo para a remoção. A área foi reintegrada ao município, mas ainda está no nome da empresa Metal Art (processo nº 1005622-28.2017.8.26.0073),motivo pelo qual a matrícula do mesmo ainda não se encontra em nome do município.

“Todas as providências já foram tomadas junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Avaré para que a Prefeitura passe a constar como seu atual proprietário, nos termos da  decisão proferida”, diz o projeto.

O vereador Luiz Claudio (PSD) destacou que gostaria de ter tido conhecimento antecipado do assunto, pois a empresa  existe há pouco tempo. De fato, a empresa foi criada em março deste ano, teria um capital de um milhão de reais e estaria sediada no bairro Village, na rua Hugo José Bannwart, 78.

Histórico

Esse depósito de amianto é motivo de preocupação para especialistas há anos. Toneladas do produto estão armazenadas de forma irregular nessa área que fica às margens da rodovia João Mellão.

O material pertenceu a uma empresa que foi desativada em 2010. Na época, parte das 200 toneladas que estavam na indústria foi retirada e enviada para um aterro legalizado em Tremembé, no Vale do Paraíba (SP). No entanto, o restante foi deixado comprometendo o meio ambiente e os moradores.

No barracão em ruínas são centenas de sacos expostos com o produto. Placas, algumas enferrujadas e jogadas no meio do mato, avisam do perigo de contaminação na área. De acordo com o alerta feito na época pelo médico Benami Francis Dicler, que foi vereador (PT), ex-funcionários da empresa que tiveram contato com o produto e moradores da região deveriam ter a saúde acompanhada com frequência. “Todos os trabalhadores devem ser rigorosamente monitorados devido ao aumento da incidência de câncer. E a própria população da região, que nos últimos 10 ou 15 anos teve contato com o amianto através dos ventos, chuva e água, deve ser acompanhada”, afirmou.

O médico ressaltou ainda que o amianto deveria ter sido eliminado do local, além de ser necessário fazer saneamento de toda a região onde ele ficou exposto. “Para eliminar completamente os riscos de contaminação é preciso fazer a remoção de uma camada superficial de terra da área. Só assim a região poderá ser utilizada, inclusive economicamente, considerando que a área é nobre porque está ao lado da rodovia”, frisou na época.

A prefeitura sempre alegou não ter condições de fazer a retirada do produto.

Saiba mais

Segundo o portal Mapa de Conflitos (Fio Cruz) o problema, contudo, vem se arrastando desde 2001. Veja matéria publicada pelo site:

Desde 2001, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo S.A (Sabesp) identificou, a partir de denúncia de um vereador de Avaré, que cerca de 200 toneladas de lixo tóxico com amianto e fenol foram depositadas irregularmente pela empresa Auco Componentes Automobilísticos em um depósito da empresa Metal Arte no perímetro urbano do município. Ambas as empresas faliram, porém, deixaram o passivo ambiental que ameaça contaminar recursos hídricos e a saúde da população da região.

Em 2003, as empresas foram multadas pela Cestesb e obtiveram prazo de 60 dias do Ministério do Trabalho para que o material fosse retirado do local e encaminhado para destinação final. Porém, nada foi feito até 2010, quando a Prefeitura local anunciou a contratação de uma empresa especializada na gestão deste tipo de resíduo para transferi-lo a um aterro adequado localizado no município de Tremembé/SP.

A retirada do material, contudo, aconteceu apenas parcialmente. Uma parte do material permaneceu no local e na antiga fábrica da Alco até fevereiro de 2014, quando a Prefeitura de Avaré assinou um novo contrato para conclusão da retirada, quatro anos após a primeira operação.

 

Contexto Ampliado

Em outubro de 2001, um vereador do município de Avaré, no sudoeste do estado de São Paulo, encaminhou denúncia à Promotoria Pública, à Cetesb e à Secretaria Estadual de Meio Ambiente solicitando análises toxicológicas da água captada no córrego Camargo e parecer técnico quanto à possibilidade de contaminação do lençol freático e do referido córrego devido à proximidade deste com um depósito onde foram abandonadas cerca de 200 toneladas de pó de amianto acondicionadas de forma irregular desde 1990. Além disso, esse lixo tóxico ameaçava de contaminação a Represa de Jurumirim, no rio Paranapanema, um dos últimos mananciais ainda não poluídos do Estado de São Paulo.

Os resíduos utilizados na fabricação de pastilhas de freio estavam armazenados no interior de um galpão, na margem da Rodovia João Mellão, a 280 quilômetros de São Paulo. O material, considerado cancerígeno e proibido por lei estadual de 2001, está a menos de 400 metros do córrego Camargo, de onde é captada parte da água potável que abastece a cidade. O terreno pertence à empresa Metal Arte, já falida, e o material tóxico foi depositado pela Auco Componentes Automobilísticos, de São Paulo, também falida (URT, 15/04/2003).

Em mapeamento realizado, a Sabesp constatou que o depósito de lixo tóxico se localiza nas proximidades do ponto de Captação do Onça, onde foram feitas análises especiais. Determinadas as irregularidades no local, a Cetesb autuou por duas vezes a Metal Arte, porém o problema não foi resolvido. A Cetesb também multou em R$ 24 mil os proprietários da Auco, que vinha sendo administrada por um grupo de 45 ex-funcionários. O Ministério do Trabalho determinou prazo de 60 dias à empresa para retirar todo o lixo tóxico depositado no galpão da Metal Arte.

Em abril de 2003, o depósito foi invadido e depredado, aumentando o risco de contaminação. O material ficou sem proteção e exposto às chuvas. O pó de amianto estava embalado em sacos plásticos pretos de 50 quilos, deteriorados pelo tempo. No local, também foi detectada a presença de fenol, um tóxico volátil que também afeta à saúde humana.

O problema, porém, permaneceu sem uma solução definitiva. Em fevereiro de 2010, a questão voltou a ser discutida quando a Prefeitura Municipal de Avaré anunciou que estava firmando uma parceria com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente para realizar a retirada do lixo do local e encaminhá-lo para um aterro onde receberia um tratamento específico para este tipo de resíduo. Segundo notícia do portal da Associação dos Defensores da Represa de Jurumirim (ADERJ), a operação foi estimada em mais de R$ 400 mil reais e seria realizada por uma empresa especializada do município de Tremembé.

A ADERJ também informou na época que a medida foi criticada pela oposição ao então prefeito por ter sido considerada cara e pontual, já que solucionaria o caso específico, mas não permitiria a gestão de material do mesmo tipo depositados em outros pontos do município, como nos lixões.

Em março daquele ano a Prefeitura anunciou o início da operação. Segundo nota da Secretaria Municipal de Meio Ambiental de Avaré, o trabalho realizado pela WPA Ambiental Indústria, Comércio e Serviços Ltda estava sendo acompanhado por representantes do órgão ambiental estadual e do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo. A retirada do material também ocorreu nas dependências da antiga fábrica da Auco no município.

De acordo com nota da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, no dia 04 de março de 2010: Quatro carretas, lotadas cada uma com cerca de 22 enormes sacos de nylon contendo cerca de 1 tonelada de amianto em cada embalagem, saíram das dependências da antiga fábrica, em direção a Tremembé, onde seriam depositados em um aterro sanitário industrial para resíduos perigosos, licenciado pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo CETESB. A saída dos caminhões foi festejada com rojões, gritos e palmas pelos presentes.

Também estavam presentes, na ocasião da saída das carretas, especialistas do assunto, como a engenheira e auditora do Ministério do Trabalho, Fernanda Giannasi, o ex-vereador e médico hepatologista em Avaré, Benami Francis Dicler, o deputado Marcos Martins, autor da lei estadual que proibiu o uso do amianto no Estado, o vice-presidente da Câmara Municipal de Avaré, Jair Canovas, e prefeitos da região.

Contudo, em novembro de 2012, uma reportagem da TV Tem republicada no portal G1 denunciou que a operação de retirada do material foi realizada apenas parcialmente; ao contrário do que havia sido divulgado pelos órgãos ambientais municipais e estaduais dois anos antes, cerca de 80 toneladas do material ainda permaneciam no local.

Presente por ocasião do início da retirada do material, Fernanda Giannasi voltou ao local em 2012 e constatou a irregularidade. Entrevistada pela reportagem, ela afirmou na ocasião: Esse material está armazenado inadequadamente. Os galpões estão depredados. É preciso uma ação muito forte que ponha fim neste material.

O então secretário do meio ambiente de Avaré, César Augusto de Oliveira, afirmou ao telejornal que Infelizmente não temos condições suficientes para a retirada do resto do material. Nós precisaríamos de parceiras para poder fazer essa remoção.

Em março de 2013, a Prefeitura da Avaré anunciou que o então prefeito Poio Novaes e o secretário municipal de Agricultura, Abastecimento e Meio Ambiente, Francisco Barreto, haviam finalmente se encontrado com o secretário estadual de Meio Ambiente, Bruno Covas, para discutir o estabelecimento de uma nova parceria para completar a remoção do material. Um novo contrato com este objetivo, contudo, só foi assinado pelo poder municipal em fevereiro de 2014.

Segundo nota da Secretaria Municipal de Agricultura, Abastecimento e Meio Ambiente, o contrato assinado pelo município com a empresa WPA Ambiental, Indústria e Comércio e Serviço Ltda, a mesma da operação realizada quatro anos antes, previa a completa remoção do material num prazo de 90 dias, a um custo de R$ 287 mil reais.

http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/conflito/sp-lixo-toxico-com-amianto-e-fenol-estao-depositados-irregularmente-em-um-deposito-no-perimetro-urbano-de-avare/

(Fonte G1 e Mapa de Conflitos e Foto Fora de Pauta)