A pandemia da covid-19 forçou o mundo a buscar novas fórmulas de sobrevivência e adaptação a rotina. E, não dá para negar as evidências, a transformação rápida do modo de vida, somada ao pânico da contaminação e as mortes provocadas pela doença, vem trazendo consequências. Como efeito colateral, muitas pessoas estão desenvolvendo transtornos de saúde mental. Para se ter uma ideia, nos meses de abril e maio do ano passado, oito entre dez brasileiros já sofriam de algum transtorno de ansiedade; eram os primeiros meses da pandemia, quando houve o aumento das mortes pelo novo coronavírus. Os estudos não foram atualizados, mas não é preciso esperar por eles, para se ter uma ideia do quanto os transtornos aumentaram ainda mais este ano, quando a pandemia parece não ter fim.
Os dados acima foram revelados por uma pesquisa feita em 2020 pelo Ministério da Saúde com 17,5 mil brasileiros entre 18 e 92 anos de idade. Mas são confirmados por estudos em todo o mundo e registrados na literatura médica como uma fobia específica do coronavírus. O transtorno foi descrito pela primeira vez em dezembro de 2020, num estudo publicado pelo Asian Journal of Psychiatry e batizado como coronafobia.
Segundo o especialista em saúde mental da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, o psicólogo João Paulo Machado de Sousa, é esperado um aumento dos transtornos de ansiedade em época de pandemia, já que o medo de contágio fica mais acentuado. Mas, adianta o psicólogo, ainda não se tem um diagnóstico formal da coronafobia que, por ser muito recente, não consta das classificações diagnósticas utilizadas pelos médicos profissionais da área. Classificações estas importantes para as trocas de informações e tratamentos das doenças. Cauteloso quanto ao surgimento de um novo transtorno de saúde mental, o psicólogo lembra que existem outras questões a serem analisadas, como a criação de protocolos para lidar com o novo transtorno, a verificação dos estágios de avaliação do paciente e a implementação do melhor tratamento.
Sintomas e prevenção – A coronafobia é um transtorno de ansiedade e é caracterizado pelo medo excessivo, persistente e irreal de situações, pessoas, objetos. Como todo transtorno de ansiedade, a coronafobia é um problema de saúde mental que requer atenção médica e psicológica. “Toda fobia tem sintomas físicos, cognitivos e comportamentais. Como sintomas físicos existem as palpitações, os aumentos do batimento cardíaco, aumento da sudorese, que é o suor excessivo, agitação psicomotora e perturbação ou privação do sono”, afirma Sousa. Tem também a sensação de falta de ar, que é um dos principais sintomas da covid-19.
Os primeiros sinais de que alguma coisa está errada são quando a pessoa apresenta as mesmas preocupações com o coronavírus que todo mundo apresenta, mas de forma exagerada e, principalmente, quando a preocupação causa prejuízos, afetando relacionamentos, atividades profissionais – quando o medo do contágio atrapalha o rendimento no trabalho – e até a integridade física, com algum risco médico. “Nós tivemos muitas pessoas que se intoxicaram no início da pandemia porque ingeriram vários produtos de limpeza, como os derivados de cloro”, relata o psicólogo.
Sousa afirma ainda que, em termos cognitivos, há ruminações contínuas ou pensamentos obsessivos do tipo “eu vou morrer”, “vou me contaminar”, “vou contaminar minha família” ou “o mundo inteiro nunca mais vai sair dessa pandemia”. Como comportamento mais saudável, o terapeuta indica que se deve evitar locais públicos, meios de transportes compartilhados e a necessidade de reassegurar constantemente a ausência da doença através de testes contínuos.
Para a prevenção dos riscos da pandemia aos transtornos mentais, Sousa acredita que devemos ficar alertas “quando as medidas usadas para prevenção acabam trazendo problemas para o indivíduo e quem está à sua volta. Exigências de cuidado que acabam criando conflitos. O limite entre prevenção e fobia é cruzado quando os comportamentos começam a ficar excessivos e causam prejuízos”.
(Fonte Jornal da USP e Ferraz Jr)