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A possibilidade de o Brasil ficar em um estado de estagflação em 2022 já existia desde o início do ano. Este termo significa que grande parte das projeções do mercado para o crescimento do país era quase zero e de inflação abaixo de dois dígitos, porém, ainda em alta. Os reflexos da pandemia do coronavírus foram semelhantes aos de um conflito. Dependendo da duração da guerra da Rússia contra a Ucrânia (que já passou de um mês), as péssimas expectativas para a economia do Brasil podem se concretizar.

Contudo, é verdade que não estaremos ‘sozinhos’. A invasão da Ucrânia pela Rússia tem afetado economias em todo o mundo. Ela deve desacelerar o crescimento da economia global e elevar a inflação, com efeitos sobre todos os países, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). O conflito provocado pela invasão do território ucraniano pela Rússia já prejudica a economia global, com o encarecimento de alimentos e do petróleo reforçando a inflação em todo o mundo.

A guerra na Ucrânia é uma “catástrofe mundial” que cortará o crescimento econômico global, disse o presidente do Banco Mundial. “Como a inflação já estava subindo, a guerra na Ucrânia chega num momento ruim para o mundo”, afirma David Malpass. Ele enfatizou que sua maior preocupação é “sobre a pura perda de vidas humanas” que está ocorrendo. Acredita-se que milhares de civis e soldados foram ( serão) mortos pelos combates.

Malpass disse que o impacto econômico da guerra se estende além das fronteiras da Ucrânia, e os aumentos nos preços globais de energia em particular “atingem mais os pobres, assim como a inflação”. Segundo ele, tanto a Rússia quanto a Ucrânia são grandes produtores de alimentos. A Ucrânia é o maior produtor mundial de óleo de girassol, com a Rússia em segundo lugar. Os dois países também respondem por 28,9% das exportações globais de trigo. Os preços do trigo na bolsa de futuros de Chicago estão sendo negociados em máximas de 14 anos. Os suprimentos russos dessas commodities estão sendo restringidos por causa das sanções generalizadas que dificultam a compra de seus produtos pelo resto do mundo. Já os suprimentos ucranianos foram interrompidos porque os combates fecharam os portos do país. “Não há como se ajustar com rapidez suficiente à perda de oferta da Ucrânia e da Rússia, e isso aumenta os preços”, diz Malpas. Ele afirma que o mesmo vale para o fornecimento de energia russo, e é particularmente prejudicial para a Europa Ocidental, onde os governos “negligenciaram outros aspectos de como ter eletricidade suficiente”.

Impacto no Brasil  – Obviamente a guerra na Ucrânia também trará efeitos de longo prazo ao Brasil. Na prática, basta ir ao supermercado para constatar os reflexos no aumento dos preços, alavancado pelas altas dos combustíveis – inicialmente. A dependência do petróleo para os transportes no Brasil que são rodoviários é o ponto principal e um agravante. Aproximadamente 60% de todo o transporte do Brasil depende de combustíveis fósseis. Essa é a razão pela qual o país está entre as economias que mais sofrerão os efeitos causados pela guerra na Ucrânia. “Quanto mais petróleo usamos, mais estamos expostos aos impactos econômicos desse conflito”, reforça o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Eduardo Mello.

Além disso, o Brasil também depende da Rússia através da importação de fertilizantes. Isso porque, o país importa cerca de 80% das 40,6 milhões de toneladas de fertilizantes consumidos pela agricultura todos os anos, tendo em vista que a Rússia é responsável por 1/4 das importações.  Por esta razão, o coordenador de relações internacionais do Ibmec, José Niemeyer, explica que o plantio direto não funciona em grandes áreas que demandam fertilizantes ou a produtividade é muito afetada. Assim, as cadeias de produção de grãos, bem como, por tabela, além da criação de aves e suínos.

 

Estas são algumas das consequências de um terremoto geopolítico que se tornou um terremoto econômico

 

Preços disparam – O conflito fez os preços das matérias-primas dispararem, a começar pelo petróleo. O barril do tipo Brent do Mar do Norte valia 90 dólares em fevereiro e alcançou US$ 139,17 em 7 de março, o nível mais elevado desde a crise financeira de 2008. Desde então, os preços permanecem voláteis. A alta é percebida nos postos de combustíveis, obrigando muitos países a tomar medidas como as reduções fiscais na Suécia ou a limitação de preços na Hungria.

Ao contrário dos Estados Unidos, a União Europeia, muito limitada por sua dependência de Moscou, decidiu não impôr embargos aos hidrocarbonetos russos, ainda que expresse o desejo de ser independente da energia russa até 2027. Na esteira dos preços da energia, os metais produzidos na Rússia, como o níquel e o alumínio, também registraram alta expressiva dos preços, a níveis sem precedentes, provocando um aumento nos custos de produção. Também têm se tornado comum as rupturas nas cadeias de abastecimento, sobretudo nas indústrias automotivas, como já havia ocorrido com a pandemia de covid-19.

 

Ameaças à segurança alimentar – “A guerra na Ucrânia significa fome na África”, advertiu o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a ONU alertou sobre um “furacão de carestias”. O conflito atual envolve duas superpotências agrícolas, Rússia e Ucrânia, que representam 30% das exportações mundiais de trigo, causando a alta nos preços dos cereais e do óleo de forma imediata. A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) adverte que, se a guerra continuar, entre 8 e 13 milhões de pessoas a mais poderiam sofrer de desnutrição em todo o mundo. Mesmo que EUA, Índia e Europa possam substituir parte do trigo que faltará, a situação é mais complexa para os óleos de girassol e de milho, dos quais a Ucrânia é o primeiro e quarto exportador mundial, respectivamente.

 

Febre nos mercados e temor de um default russo – O ano de 2022 começou com resultados empresariais que mostravam uma recuperação econômica pós-covid-19. No entanto, a guerra colocou os mercados em um estado febril. Na Rússia, as sanções ocidentais paralisaram parte do sistema bancário e financeiro, o que provocou a desvalorização do rublo até 177 unidades por dólar em 7 de março, contra 75 por dólar no início de fevereiro.  Além disso, 300 bilhões de dólares de reservas russas no exterior foram congeladas. As medidas fizeram o mercado temer um calote russo pela primeira vez desde 1998, que finalmente não aconteceu. A Bolsa de Moscou ficou fechada por quase três semanas e reabriu parcialmente no final de março.

 

O dilema das empresas ocidentais – Centenas de empresas ocidentais anunciaram a saída ou, ao menos, o congelamento das atividades na Rússia, de forma voluntária ou involuntária, por medo das sanções, da opinião pública ou por pressão política. Grandes empresas como a petroleira britânica BP, Ikea, McDonald’s ou Coca-Cola decidiram congelar as atividades no país. Outras, porém, decidiram prosseguir com as atividades argumentando que não poderiam abandonar seus funcionários ou privar a população de produtos básicos.

 

Freio no crescimento econômico –A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) prevê uma redução de um ponto no crescimento econômico mundial pelo impacto da guerra e o FMI deve reduzir sua previsão, atualmente de 4,4% para 2022. Em 18 de março, o Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento (BERD), o FMI e o Banco Mundial afirmaram estar “profundamente preocupados” com a “desaceleração do crescimento, interrupção do comércio” e um impacto especialmente grave “nos mais pobres e vulneráveis”.

 

(Fontes BBC, Estado de Minas, Veja, Exame, Gazeta do Povo, CNN, e Reuters)