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Na primeira sequência de “Pieces of a Woman”, produção original da Netflix, somos transportados para a casa do casal de protagonistas que decidiu ter sua primeira filha com a ajuda de uma parteira. Em meio a gemidos e contrações aflitivas, a câmera passeia por entre os cômodos da casa e do corpo da grávida que não aguenta mais, numa tensão crescente onde se sabe que uma tragédia é iminente, e quando ela acontece é de um impacto atordoante, mesmo depois que a trama acaba.  O que era pra ser um acontecimento poético acaba num pesadelo ultra realista de tirar o fôlego.  Corte pruma tela preta com o título perfeito de “Pedaços de Uma Mulher”, pois alguém que perde um filho fica em frangalhos e talvez nunca mais consiga se recompor… só o tempo dirá.

Os eixos dramáticos da trama são três: a morte trágica da bebê, o julgamento da parteira pelo erro e a crise no casamento dos protagonistas. Martha (Vanessa Kirby) e Sean (ShiaLaBoeuf) decidiram por ter um parto domiciliar mas no dia em que o trabalho começa a doula escolhida não está disponível e envia uma substituta; as coisas não saem como previsto e o pior acontece.

O casamento deles vai desabando a olhos vistos. Martha decide por não se vitimizar e vira uma pedra de gelo reclusa que repele com agressividade todo e qualquer ato de solidariedade e carinho vindo dos amigos e familiares. Ela sofre em um silêncio que reflete a agonia em olhares fortes e longas caminhadas, enquanto seu marido está aberto à ajuda e luta pra juntar os cacos, salvar o relacionamento e resolver a parte burocrática da morte. A passagem do tempo na trama é bem significativa, mostrada através da construção de uma ponte que também serve de metáfora pro estado emocional de Martha.

Vanessa Kirby e Ellen Burstyn estão em estado de graça nos papéis de mãe e filha sempre em conflito, há uma cena catártica onde elas discutem no jantar de “Ação de Graças” que define o caminho que a trama vai tomar, um diálogo fortíssimo com atuações esplendorosas. A maternidade é vista sob esses dois pontos de vista: o de Martha que a viveu por breves segundos e não sabe como substituir o vazio que ficou, e sob o olhar de sua mãe dominadora que não sabe onde errou, ambas competindo nas feridas emocionais  e arrependimentos profundos.

Em tempos de negacionismo e ruptura de alguns grupos com a ciência e a medicina, apesar de todos os avanços, o novo filme da Netflix traz um tema muito atual e relevante: parto caseiro e suas possíveis consequências nefastas. Um filme doloroso e necessário, de uma beleza triste que leva tempo pra digerir, mas que por outro lado traz alento e um sopro de esperança pra quem sofreu grandes perdas e não tem forças pra recomeçar.

Em tempos de negacionismo e ruptura de alguns grupos com a ciência e a medicina, apesar de todos os avanços, o novo filme da Netflix traz um tema muito atual e relevante: parto caseiro e suas possíveis consequências nefastas. Um filme doloroso e necessário, de uma beleza triste que leva tempo pra digerir, mas que por outro lado traz alento e um sopro de esperança pra quem sofreu grandes perdas e não tem forças pra recomeçar.