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Uma das frases mais famosas de Nelson Rodrigues diz que ‘toda unanimidade é burra’, mas obviamente o dramaturgo não conheceu Gilson Câmara. Invejosos dirão que é exagero e torcerão o nariz, claro rsrs, mas pergunte a algum artista de Avaré qual o melhor secretário de Cultura em um passado recente e a resposta será seu nome. Questione ainda quem foi um dos maiores artistas que a cidade já teve e o nome dele aparecerá de novo. Além do legado que Gilson deixou na carreira pública, ele também é um artista e por isso, foi a ‘onda encontrando o oceano’. Mais que reverenciar a arte é preciso vivenciá-la e isso Gilson o fez com maestria.

Nascido em Avaré em 1972 no dia 26 de junho, Gilson Câmara Filgueiras, é diretor, ator, dramaturgo renomado e atualmente, Professor de Literatura. Filho do casal Leonor Câmara Filgueiras e Álvaro Filgueiras Júnior (falecido), Gilson tem um currículo impressionante tanto como ator e dramaturgo, como secretário. Após deixar os palcos e vida pública, ele agora se destaca como professor, talvez inspirando-se na mãe que também lecionava.

O pai era administrador contábil da empresa do irmão Gilberto Filgueiras (também falecido); ele e Leonor tiveram quatro filhos: Gilson, Geder Câmara Filgueiras (falecido), Gerson Câmara Filgueiras, corretor de imóveis e Greyciane Câmara Filgueiras, empresária no ramo de perfumes.

Casado com Letícia Fujita Castilho Câmara, Gilson realizou o sonho de ser pai da pequena Maria Clara Fujita Castilho Câmara, de apenas 1 ano e cinco meses e que, segundo ele é “o mais perfeito de todos os sonhos”.

Tanto sua missão quanto seu propósito estão alinhados no mesmo verbo e idealismo: ensinar. É isso que ele tem feito na vida, na arte e na escola, sempre com dedicação e talento ‘tamanho G’ (ou extra G).

O mesmo G de Gilson também está em grandioso – adjetivo constantemente atribuído a ele, apesar da modéstia inegável. Nesta entrevista, ele conta um pouco de sua infância, sua carreira, suas conquistas, sua trajetória; mais do que contar, Gilson brinda os leitores com seus deliciosos relatos para nosso deleite.

 

A infância e a juventude

Passei minha infância brincando nas ruas do bairro Ipiranga. Na casa de meus primos e de meus bisavós – por parte de minha mãe – todas as brincadeiras antigas ( Pular corda – Amarelinha –  Pião – Queimada – Batata quente – Pega-pega – Bolinha de gude, etc) passaram por meu repertório. As goiabeiras do quintal da casa de minha madrinha e de meu padrinho (Tia Eurides e Tio Wladimir) serviam de avião para que eu me tornasse um piloto de caça. A imaginação voava longe. Minha adolescência, eu passei no armazém que meus pais tinham na rua Pará. Lembro que, nas confluências, havia a antiga Algodoeira Paulista S/A. Nesse local, com anuência dos funcionários, eu corria entre os “fardos” de algodão. Até hoje, eu tenho a sinestesia do cheiro daquele espaço em minha memória afetiva. Na juventude, estudei no Matilde Vieira (o ensino fundamental I), depois fiz o ensino fundamental II na Escola Estadual Paulo Araújo de Novaes, na mesma escola cursei os dois primeiros anos do ensino médio. Foi no PAN que tomei gosto por um esporte: o basquete. Joguei pelo time da cidade de Avaré por algum tempo, e, deixando de lado a modéstia, eu tinha um bom arremesso de três pontos. Este esporte me proporcionou formar belas amizades duradouras. Terminei meus estudos em São Paulo, na Escola Estadual Prof. Adolfo Casais Monteiro, ao mesmo tempo estudei no cursinho do Colégio Objetivo de Santo Amaro. Algumas aulas eram ministradas na unidade da avenida Paulista, e até aqui nunca imaginei ser artista de teatro.

 

A paixão pela dramaturgia

Foi exatamente na cidade de São Paulo que tive meus primeiros contatos com o teatro; no entanto, ainda como público. A unidade do Colégio Objetivo da Paulista proporcionava aos alunos o contato prático com grupos de teatro que montavam espetáculos cênicos voltados aos conteúdos literários dos vestibulares. Fiquei completamente encantado com os espetáculos que assisti naquela época. Ainda ecoam em minha mente frases textuais nas vozes dos atores e atrizes. Assim, passei em Agronomia. A faculdade ficava em Paraguaçu Paulista, cidade do interior de São Paulo. Foi lá que tive um contato mais direto com o teatro. Uma professora da faculdade, Lucila Nascimento, emprestava o seu nome ao teatro municipal, e por meio de sua empolgação conheci a arte teatral de uma maneira mais intensa. Dessa forma, me envolvi com o movimento cultural da cidade, e conheci o diretor teatral e professor Reginaldo Galhardo. Foi ele, através de seus espetáculos, que me motivei e montei o Grupo de Teatro Gil Vicente. Nascia a minha paixão pela arte teatral.

 

Palcos e premiações

Com o Grupo de Teatro Gil Vicente formado, montei meu primeiro espetáculo teatral (22/06/1997) : “Para viver um grande amor”, inspirado nas obras poéticas, musicais e teatrais do grande artista Vinicius de Moraes ( espetáculo apresentado em Avaré, no teatro municipal Octávio Morales Moreno, no mesmo ano). De Paraguaçu Paulista, fui me aventurar na cidade de Rio Claro. Morei por pouco mais de um ano na chamada “Cidade da Alegria”, no entanto foi a época que consegui me desenvolver enquanto artista, formando a minha personalidade poética e teatral. Conheci excelentes artistas e poetas, e o Grupo de Teatro Gil Vicente tinha uma nova sede, com atores e atrizes que se dedicaram de corpo e alma aos espetáculos que foram montados em solo rioclarense. Creio que nesta fase, o melhor trabalho desenvolvido foi a montagem do espetáculo “O Alienista”, adaptado do conto homônimo de Machado de Assis. Depois, deu-se a minha volta para Avaré. Em minha cidade natal, ousei montar um espetáculo poético, inspirado no livro do escritor romântico Castro Alves. Sem dúvida alguma, posso afirmar que com este trabalho teatral, a Companhia de Teatro Gil Vicente (uma nova nomenclatura da trupe, aceitando a ideia do jornalista Fernando Santos) ficou famosa e ganhou respeito em nossa cidade e em muitas cidades do Estado de São Paulo. Com “ Espumas Flutuantes”, ganhamos muitos prêmios em vários festivais de teatro: melhor espetáculo, melhor ator (recebi o prêmio das mãos de Walcyr Carrasco) , melhor diretor, melhor cenário, melhor sonoplastia, melhor figurino, melhor atriz coadjuvante, melhor iluminação, entre outras premiações. Depois desta primeira montagem, não paramos de criar novos trabalhos. Em suma, tenho em meu histórico mais de 50 textos teatrais escritos, entre adaptações e de própria autoria, e um número superior a 80 prêmios cênicos.

 

Legado Cultural

Trabalhei como Secretário Municipal de Cultura de Avaré por quase dez anos. Passei pelas gestões de Joselyr Benedito Silvestre, Lilian Manguli Silvestre, Rogélio Barcheti e Poio Novaes. Realizei, juntamente com minha equipe, vários trabalhos culturais. Elaboramos eventos para todas as idades, para as mais diferentes áreas artísticas, com a nivelação estratégica de apresentar trabalhos com as características municipal, regional e nacional; bem como de dar ao evento um caráter de continuidade, objetivando a formação de público. Eventos como: Encenação da Paixão de Cristo, Festival Estadual de Teatro, Festival de Música Instrumental, Festival Literário, Festival de Fotografias, Festival de Cinema, Festival de Caricaturas, Festival de Artes Plásticas, Festival Sertanejo, entre outros. Além disso, priorizamos o trabalho de formação de novos talentos, através da criação das Oficinas Culturais José Reis Filho, e como consequência deu-se o “nascimento” do Grupo Municipal de Teatro de Avaré, com o qual a cidade foi agraciada com vários prêmios de teatro em muitos festivais do estado de São Paulo. E na mesma linha, a montagem do Centro Literário Anita Ferreira de Maria, possibilitando o lançamento de vários livros de poesias com o incentivo do poder público.

 

O Mestre

Creio que a minha ida para a educação era inevitável. Passei minha infância, minha adolescência e minha juventude vendo a minha mãe (Dona Leonor Câmara) trabalhar como professora. A dedicação, o amor e o profissionalismo com que ela exercia a difícil arte de lecionar, de uma maneira ou de outra, me encantou. Uma semente foi plantada. Mesmo durante a faculdade de Agronomia eu já comecei a entrar em contato com o meu lado professoral. Ministrei aulas de reforço de matemática para os alunos de termos inferiores ao meu. Imagine: aulas de Cálculo Integral e de Cálculo Diferencial. Tomei gosto. A semente já estava germinando. Em Avaré, dei aulas de teatro, de matemática, física e química para o colégio Anglo; e por mais de dez anos fui professor de teatro da Faculdade Aberta da Terceira Idade da FREA. Enfim, a semente floresceu. Veio a formação em Letras e ensinar passou a ser minha caminhada diária e minha felicidade de vida.

 

Jogo Rápido 

Um sonho realizado:  Ser ator e professor, e jamais imaginaria que ser pai seria o mais perfeito de todos os sonhos.

Um sonho a realizar: Escrever um livro.

Uma cidade: Minha Avaré.

Um país: Meu Brasil.

Um lugar: Minha casa.

Uma crença:  Deus.

Uma esperança: Que o amor vença o ódio.

Uma ideologia: A democracia do conhecimento.

Uma qualidade: Estudioso.

Um defeito: Teimoso.

Um esporte: Basquete.

Um time: Corinthians.

Um animal: Gato.

Um  hábito ou mania: Ler.

O que te faz sorrir:  A minha família.

O que te entristece: A desigualdade social.

Uma inspiração:  A natureza. É buscar nas pequenas coisas um grande motivo para ser feliz!

O que mais admira:  A vitória de pessoas marginalizadas pela sociedade.

O que mais detesta: A falsidade do ser humano.

Um dia inesquecível: O nascimento de minha filha – Maria Clara.

Um livro:  Quarto de despejo – Carolina Maria de Jesus.

Um  autor: Willian Shakespeare.

Uma música:  Todas de Vinicius de Moraes.

 Um filme: Sociedade dos poetas mortos.

 Uma peça teatral:  Hamlet – Willian Shakespeare.

Uma artista: Fernanda Montenegro

Uma cor: Azul

Uma lembrança: O cheiro de todos os teatros que eu já me apresentei. Para mim o cheiro das coisas são lembranças que ficam de forma sinestésica em nossa memória.

Um amor: O amor infinito de uma mãe e de um pai.

Sua missão: Ensinar.

Seu propósito: Ensinar que a arte muda caminhos sem perspectivas.

Brasil:  Um país abençoado por Deus, e bonito por natureza. Pena que os políticos destroem os belos versos do poeta.

Brasileiro:  Povo sofrido pela má atuação dos políticos

Avaré: Minha “Aldeia”

Um epitáfio:  Os seus olhos têm que ser só dos meus olhos
E os seus braços o meu ninho
No silêncio de depois
E você tem que ser a estrela derradeira
Minha amiga e companheira
No infinito de nós dois.

Uma frase que o defineSou eu a escolha de mim.

Vida:  É arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida

Gilson por Gilson : Vem por aqui” — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: “vem por aqui!”

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos…