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O termo é novo, mas talvez – infelizmente – tenhamos que nos acostumar com ele. Segundo o Novíssimo Dicionário de Economia, organizado por Paulo Sandroni, “estagflação” é uma “situação que ocorre quando a estagnação ou o declínio do nível de produção e emprego se combinam com uma inflação acelerada”. Outros a definem como o enfraquecimento da reação econômica em meio a uma crise, como a da Covid-19, aliada a uma escalada assustadora de preços de produtos e serviços. Na prática, esse é o calvário pelo qual os brasileiros passam, vendo semana a semana, novos aumentos – seja pela crise hídrica, de energia ou infindáveis ‘reajustes’ dos combustíveis – nos supermercados, nas quitandas, nos postos e nas farmácias.

Os preços sobem e a vida não melhora. Essa combinação de percepções atingiu com mais força a vida do brasileiro nos últimos meses e parece não querer ir embora como um prenúncio da estagflação, que tem como “pais”, dois monstros em comum:  inflação alta com baixo crescimento.

Pressionado sobretudo pelos combustíveis e pela energia elétrica, o IPCA, índice oficial de preços, já encostou nos dois dígitos em 12 meses, muito acima do teto da meta para o ano. Enquanto isso, a previsões para o avanço do PIB (Produto Interno Bruto) no terceiro trimestre já ficam perto de zero, depois de uma leve queda na atividade de 0,1% de abril a junho.

“Isso é preocupante. Se tivermos outro trimestre com PIB negativo, já entramos em uma estagflação técnica, já que a inflação está bastante alta. E tudo indica que nosso crescimento no terceiro período do ano vai ser muito baixo”, diz Matheus Peçanha, economista e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre).

O desempenho da atividade dos próximos trimestres pode ser só uma mostra de um cenário mais consolidado de estagflação que está sendo desenhado para 2022, já que, para este ano, a expectativa é que a economia brasileira cresça em torno de 4% devido à baixa base de comparação. No ano passado, a queda superou 4%, devido à pandemia.

Alguns se perguntam qual a diferença em relação a chamada inflação inercial. Essa é basicamente causada por questões especulativas. A falta de confiança por parte do mercado gera um círculo vicioso no qual há a indexação da economia. Em outras palavras, índices de inflação são criados, servindo de reajuste de salários e preços e causam uma espiral inflacionária.

A verdade é que no atual momento é quase impossível separar ambos conceitos, pois não importa qual seja, já que este cenário penaliza sobretudo os trabalhadores mais pobres, já que o desemprego sobe em meio a uma alta acentuada no custo de vida.

A expressão estagflação foi disseminada em meio à crise do petróleo, que atingiu as principais economias nos anos 1970. Naquele cenário, a commodity passava por uma acentuada valorização, pressionando os preços da economia e piorando o quadro de desemprego, sobretudo nos Estados Unidos.

O último processo claro de estagflação que o Brasil viveu foi nos anos de 2015 e 2016. No primeiro, a economia retraiu 3,5% com um IPCA maior que 10%. No segundo, a retração foi de 3,3%, com inflação de 6,29%. Desde então, a atividade veio se recuperando de forma tímida e com dificuldade, até levar o baque da pandemia. Hoje, apesar de a atividade estar patinando em meio à alta dos preços, o país ainda não pode ser enquadrado num cenário de estagflação, segundo alguns economistas.

 

Retrocesso e baixo crescimento

O Brasil está longe de ter uma economia aquecida já há algum tempo; por isso, alguns especialistas acreditam que o país já vive num processo de estagflação, considerando um período mais longo.

Atualmente situação se complica, porque a ação do Banco Central sobre a inflação é limitada, já que não é a demanda aquecida que pressiona os preços. A inflação é agravada pela crise hídrica — que aumenta muito o custo da geração de energia –, e pela alta no preço das commodities — resultado de cadeias produtivas desestruturadas e queda de oferta –, que acaba deixando o custo dos produtores mais alto e, consequentemente, afeta o valor do produto final.

“O BC, como tem meta de inflação, precisa elevar a taxa de juro. Mas, sem ajuste fiscal, a taxa de juro estrutural aumenta, o que implica em mais alta de juro. Em outras palavras ficamos num círculo vicioso, o que dificulta a retomada do crescimento sustentável”, diz o economista Alexandre Espirito Santo .

Se de um lado a Selic mais alta reduz a quantidade de dinheiro na economia para puxar os preços para baixo, de outro, freia o ritmo da atividade, já prejudicado pelos impactos da pandemia. A Selic mais alta foi um dos motivos do Itaú para revisar recentemente sua projeção para o PIB do ano que vem de 1,5% a 0,5%. O banco também revisou sua expectativa para o câmbio que, neste ano, deve chegar a R$ 5,00.

Tradicionalmente, o câmbio tende a valorizar com os juros mais altos — refletindo a melhora no retorno para investidores estrangeiros e a consequente entrada de dólares no país –, mas a moeda tem sofrido efeito inverso pela instabilidade política e econômica. E a taxa cambial afeta diretamente os preços de toda a economia.

A deterioração do cenário fiscal é resultado de propostas de reformas desidratadas e com a tramitação atrasada. Nesse pacote, entra uma crise institucional alimentada pela tensão entre os Poderes.

A instabilidade macroeconômica afasta investimentos, e o mercado deixa de acreditar que as reformas estruturantes consideradas hoje pelo Legislativo e pelo Executivo solucionem esse cenário.

Então, lamentavelmente não há boas notícias. O Brasil parece caminhar para o pior dos mundos: a estagflação. Por ora, não há sinal de trégua na escalada dos preços que tem, por baixo, conhecidas e graves consequências: destrói o poder de compra da população; a expectativa de venda de produtos e serviços de empresas, com impacto na produção; e aborta pontos do produto interno bruto (PIB). Para domar a inflação, o Banco Central aperta o juro. E não vai parar.

Onde tudo isso vai nos levar? Ninguém sabe.

(Fontes CNN, G1, Exame e Valor Invest)