A capa desta edição 259 do in Foco poderia ser comemorativa, mas é reflexiva – quase um ‘manifesto’ contra todo tipo de violência que atinge as mulheres. É maravilhoso receber mimos, flores e presentes no 8 de março, mas é triste ver a realidade do dia a dia: a cada minuto, cerca de 8 mulheres são agredidas no Brasil.

Só no primeiro semestre de 2022, 699 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil, média de quatro mulheres por dia, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública – é o maior número já registrado em um semestre. Já no segundo semestre do ano passado, foram  mais de 31 mil denúncias e 169 mil violações envolvendo a violência doméstica contra as mulheres.

Se comparado com 2019, o crescimento foi de 10,8%, “apontando para a necessária e urgente priorização de políticas públicas de prevenção e enfrentamento à violência de gênero”, diz o Fórum. O aumento foi de 3,2% em relação ao primeiro semestre de 2021, quando 677 mulheres foram assassinadas.

Desde 9 de março de 2015, a legislação prevê penalidades mais graves para homicídios que se encaixam na definição de feminicídio – ou seja, que envolvam “violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher”. Os casos mais comuns desses assassinatos ocorrem por motivos como a separação. Mas o recorde de feminicídios em 2022 acende um alerta e aponta para um crescimento da violência letal contra meninas e mulheres em decorrência do gênero. Dentre as regiões, a Norte foi a que apresentou maior crescimento no primeiro semestre dos últimos quatro anos, com aumento de 75%. A região Centro-Oeste também teve crescimento significativo, com 29,9% de alta entre 2019 e 2022.

Já dentre as unidades da federação, Rondônia teve o maior aumento, 225%, seguido por Tocantins, 233,3% e Amapá, 200%, todos na região Norte.  Na contramão, o número de homicídios no Brasil teve queda no primeiro semestre de 2022. Foram 20,1 mil assassinatos nos primeiros seis meses do ano passado, o que representa uma queda de 5% em relação ao mesmo período de 2021.

Não dá para ignorar estes números, até porque eles continuam aumentando a cada ano apesar das leis. Até mesmo em Avaré, o número de casos aumentou 120% em 2021. É chover no molhado? Não! Até porque é papel da imprensa nunca deixar isso cair no esquecimento ou deixar que a sociedade se ‘acostume’ com este tipo de violência.

Tradicionalmente o 8 de março tem o papel histórico de colocar luz sobre as diversas formas de desigualdade, violência e opressão que as mulheres enfrentam. Num contexto onde 41% das brasileiras tem receio de se expressar ou se posicionar, esse protesto é importante. Apesar de estarmos na segunda década do século XXI, ainda há, em todo o mundo, pessoas que acreditam que as mulheres são inferiores aos homens. No Brasil, 19% dos homens acredita na inferioridade feminina – e algumas mulheres (14%) concordam (absurdamente) com eles.

A grande maioria dos entrevistados no mundo todo pela Ipsos, no entanto, é consciente da desigualdade os dois sexos. Globalmente, 72% dos entrevistados disseram que existe desigualdade em termos de direitos sociais, políticos e econômicos para as mulheres. No Brasil, a diferença é percebida por 78% das pessoas. O País que menos acredita na desigualdade de gênero é a Rússia, onde 42% dos entrevistados declararam que existem diferenças sociais e de direitos entre homens e mulheres.

Essa desigualdade aliada ao machismo se reflete nos números acima citados em relação à violência.

 

Raio-X do feminicídio

 

68,7% das vítimas de feminicídio tinham entre 18 e 44 anos

16% delas tinham entre 18 e 24 anos

12,3% entre 25 e 29 anos

14,4% entre 30 e 34 anos

15,2% entre 35 e 39 anos

10,8% entre 40 e 44 anos.

62% eram negras

37,5% brancas 0,3% amarelas

0,2% indígenas

81,7% das vítimas foram mortas pelo parceiro ou ex-parceiro íntimo

Desconhecidos apareceram como autores apenas em 3,8% dos casos

(Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública referentes a 2021)

 

A falha do poder público

Dados do relatório da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Feminicídio de 2021 deixam evidentes as falhas do poder público em proteger mulheres vítimas deste crime. Em 100% dos casos, os agressores eram reincidentes em violência doméstica. Uma atuação célere, punição e a criação de uma rede de proteção poderiam ter evitado a dor que se abateu sobre as vítimas, familiares e amigos. Foram analisados 90 processos entre 2019 e 2021. Um dos maiores problemas encontrados é a falta de integração entre os serviços de proteção. As medidas protetivas, quando concedidas, são positivas, mas são insuficientes porque não há um monitoramento posterior. E lamentavelmente, em muitos casos a conhecida lentidão do Judiciário contribui para isso.

 

 

 

Medidas Protetivas

 

O que fazer quando o agressor descumpri-las?

Avisar urgentemente as autoridades. Pode ser na delegacia, na vara especializada, na Defensoria Pública, ou mesmo pelos  telefones de denúncia (180) ou da polícia (190).

 

Quanto tempo pode durar?

Não tem tempo especificado. Alguns juízes aplicam-nas por tempo indeterminado, outros o prazo é de um ano dependendo do caso.

 

Qual a importância do afastamento?

Para garantir que não haverá novos ataques físicos à mulher. Porém, pela Lei Maria da Penha, as medidas podem ser modificadas.

 

A mulher pode revogar a medida protetiva?

 Sim. Cabe ao juiz verificar se isso não está sendo imposto forçadamente pelo homem e decretar a revogação da medida