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A matéria de capa do in Foco impresso que chegou às bancas no sábado, 30, aborda mais uma vez a violência contra a mulher.

Contudo, um dos tópicos da reportagem causa estranheza: apesar dos crimes que tem deixado a população revoltada, a Delegacia de Defesa da Mulher afirma – inusitadamente – que não houve nenhum registro “de feminicídio na cidade desde 2017.

“(…) Após uma revisão dos registros de boletins de ocorrência de 2020 a 2024, constatou-se a ausência de casos de feminicídio consumado nesse intervalo. O último registro de feminicídio em Avaré data de 03/08/2017 (BO 3585/2017 – Delegacia Secional de Avaré – Plantão)”, diz o comunicado do departamento de Comunicação da Polícia Civil.

“Em 01/10/2021, foi registrado um homicídio simples de uma mulher, cuja autoria ainda permanece desconhecida (BO 2801/2021 – Delegacia Secional de Avaré – Plantão). As investigações realizadas até o momento não identificaram os responsáveis pelo crime. A Delegacia de Investigações Gerais (DIG) esclareceu a autoria de um caso de homicídio de uma mulher em 2022, cujo corpo foi encontrado em um loteamento da cidade. As informações acima foram repassadas pelo Dr. Marco Aurélio, da DDM”, finaliza o documento. Somente Taquarituba e Sarutaiá teriam registrado feminicídios.

O balanço traz ainda a informação de que ano passado, embora não tenha tido nenhum feminicídio, foram registrados 223 boletins de ocorrência relacionados à lesão corporal no contexto da violência doméstica, abrangendo mulheres, crianças e adolescentes. O balanço não especifica o crime de estupro, que teve em média 3 casos por mês em 2022 em Avaré, de acordo com informações da própria DDM.

 

Caso Yandra

Um dos casos citados como investigado como suicídio e posteriormente como suposto feminicídio, é o da jovem Yandra Nitsche Prestes, de 25 anos, que foi encontrada morta por sua mãe no banheiro da casa dela, em Avaré, aparentemente enforcada. Inicialmente o caso foi tratado como suicídio, mas após alguns detalhes virem à tona, o crime também está sendo investigado como suposto feminicídio.

Isso porque Yandra vinha sofrendo em um relacionamento abusivo com outro jovem, L.D.B. e dois dias antes da morte, na madrugada do dia 17 de fevereiro, registrou boletim de ocorrência por agressão. Era madrugada de sexta-feira. Contudo, infelizmente o exame de corpo de delito só foi marcado para a segunda-feira, 19, data em que ela lamentavelmente foi encontrada morta. Tudo isso porque o IML (Instituto Médico Legal) responsável pelo exame, não funciona aos finais de semana.

Entretanto, uma das polêmicas que fez com que o caso sensibilizasse toda população, foi o fato de o laudo necroscópico da morte não citar as marcas da agressão dois dias antes. A família obviamente contestou o laudo e in Foco chegou a falar com o médico legista Poio Novaes, mas ele insistiu que o documento estava correto e que não havia lesões, enfatizando que havia fotos da necropsia, as quais a reportagem não teve acesso.

Dia 13 de março, família e amigos de Yandra fizeram uma manifestação pacífica na Concha Acústica, pedindo por justiça. Coincidentemente, no dia seguinte veio um laudo complementar, confirmando as marcas de agressão da vítima. “Sobre o exame pericial do médico legista, o IML nos encaminhou um novo laudo necroscópico, complementar ao primeiro, fazendo menção aos ferimentos externos que Yandra apresentava”, disse o delegado da DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) Marco Aurélio Gonçalves Gomes em entrevista ao in Foco.

Contudo, ainda há outras inconsistências no caso segundo a família, que devem ser divulgadas em breve. Além disso, a perícia grafológica e no celular da vítima não foram concluídas.

Seja como for, este caso abriu margem para o debate necessário da toxicidade nos relacionamentos em uma cidade que tem registrado aumento na violência contra as mulheres.

 

Acássia e outros casos – Praticamente um mês após a morte de Yandra, outro crime comoveu a cidade; o assassinato à sangue frio de Acássia Luiza Ferreira de 34 anos. Ela foi brutalmente morta à facadas em frente ao filho de 2 anos também em Avaré, pelo ex-companheiro, que friamente deixou o corpo na calçada. Ela chegou a ser socorrida pelo Samu, mas não resistiu aos ferimentos. O motivo do crime seria porque ele não teria aceitado o fim do relacionamento. Segundo familiares da vítima, Acássia vinha sofrendo um relacionamento abusivo com S.G. e apesar das brigas constantes motivadas principalmente quando ele bebia, a vítima não teria registrado boletim de ocorrência. Até o fechamento desta edição, o autor do crime infelizmente continuava foragido.

O assassinato da jovem Jennifer Eduarda da Cruz Blimblem, de 18 anos, encontrada morta em Avaré em 2021, continua até hoje sem culpado após muitas investigações.  “Durante a investigação foram esgotadas todas as diligências, exames periciais (inclusive DNA) e demais providências cabíveis para determinar a autoria bem como demais detalhes do caso. Então permanece em aberto até novas informações”, disse o investigador chefe da Delegacia Seccional de Avaré, Alexandre Aurani.

Na época, a Delegacia de Investigações Gerais (DIG) já havia informado que o exame para identificar se houve abuso sexual contra a vítima, encontrada morta após ficar seis dias desaparecida – foi prejudicado pelo estado em que o corpo foi encontrado.  Segundo a polícia, o corpo da jovem foi encontrado em avançado estado de decomposição, o que invalidou a perícia técnica. O corpo de Jennifer foi encontrado no dia 30 de setembro, sem roupa e às margens de uma estrada na área rural da cidade. A identidade dela só foi confirmada em 2 de outubro. O caso foi registrado como homicídio.

Em 2022, outro crime similar também chocou Avaré. O corpo de uma jovem, de 18 anos, foi encontrado na obra de um empreendimento por um homem, que operava uma máquina escavadeira. Era Allexandra Alves de Oliveira, que na época estava desaparecida há 12 dias.

Neste caso, felizmente o suspeito foi preso. O homem de 40 anos a matou estrangulada, segundo a polícia. Ele foi indiciado por feminicídio e estupro, mas já tinha cumprido 19 anos de pena por homicídio. Estava em liberdade há apenas 5 meses.

 

 O que significa o termo “feminicídio” e qual é sua origem?

O neologismo surgiu para nominar os assassinatos de mulheres cometidos em razão do gênero. No Brasil, a Lei do Feminicídio entrou em vigor em 2015 e o colocou na lista de crimes hediondos, que têm penas mais altas. A palavra vem do termo “femicídio”, cunhado em 1976 pela socióloga sul-africana Diana Russell, que sentiu a necessidade de diferenciar o homicídio de mulheres em razão do gênero.

 

Todo assassinato de mulher é um feminicídio?

Para se enquadrar o assassinato de uma mulher como crime de feminicídio, é necessário que o autor tenha cometido o ato em razão de violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Dessa forma, nem todos os assassinatos de mulheres são considerados feminicídios.

 

Os autores do feminicídio são sempre parceiros ou ex-parceiros das vítimas?

Não.  O autor não precisa ser alguém conhecido pela mulher, para que o crime seja considerado feminicídio. O assassinato de uma mulher também é considerado feminicídio mesmo quando cometido por pessoas desconhecidas da vítima. Um exemplo, é um caso de estupro com morte, quando o autor não conhece a vítima. 

 

Qual a diferença entre homicídio e feminicídio?

Os dois termos designam crimes dolosos contra a vida, mas existe uma diferença entre eles: homicídio é o ato de matar uma pessoa, independentemente de seu gênero; já o feminicídio é cometido exclusivamente pelo fato de a vítima ser mulher.

(Fonte TJMG)