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Pasme, mas tem quem acredite que a terra é plana. “Globalista, Terraplanista ou neutro?”. “Você consegue provar que a Terra é um globo, uma bola?”. “Você tem conhecimento de que o Sol e a Lua estão próximos da nossa Terra e ‘dentro’ da nossa atmosfera, (ou no firmamento) e são menores, bem menores que a Terra?”

É com perguntas como estas que grupos brasileiros de “terraplanistas” – pessoas que acreditam que a Terra é plana – avaliam a solicitação de entrada de um novo membro no fórum virtual. Na rede social, há centenas de grupos. Há também diversas páginas sobre o tema no Facebook – a maior delas, “A Terra é plana”, tem mais de 80 mil membros. Os terraplanistas também estão no YouTube, com vários canais dedicados a mostrar experimentos e discutir o que chamam de “falácias” dos “globalistas” – e versões alternativas para a explicação de fenômenos como fusos horários, estações e eclipses.

De forma geral, os terraplanistas acreditam que a Terra é coberta pelo “firmamento”, em formato de domo; Sol e Lua fariam seus percursos dentro deste espaço, e seriam corpos muito menores do que acreditam os “globalistas”; já a Antártida ocuparia as bordas do disco da Terra. O heliocentrismo (o fato de que o Sol está no centro do Sistema Solar e que os planetas giram em torno dele), a existência do espaço sideral e até mesmo de uma força invisível como a gravidade são questionados – para eles, só não “voaríamos” do solo por características dos corpos, como densidade, flutuabilidade e magnetismo.

Mundialmente, talvez a maior representação dos terraplanistas seja a Flat Earth Society (“Sociedade da Terra Plana”); aliás, nos EUA há algumas pessoas famosas que já afirmaram publicamente que a Terra é plana, como os jogadores de basquete Shaquille O’Neal e Kyrie Irving. E pior: eles culpam o “sistema” pela mentira que acreditamos: do globo ser redondo.

Mas quem seria o “sistema”?

Na teoria deles, seriam famílias que detêm metade da riqueza do mundo e que querem controlar mais de 7 bilhões de pessoas através de mentiras pré fabricadas e essa seria uma delas.

Segundo a Flat Earth Society, a explicação mais aceita pelos terraplanistas é a de que as agências espaciais estão envolvidas em uma conspiração que “falsifica viagens e explorações espaciais”. “Isso provavelmente começou durante a corrida espacial na Guerra Fria, onde a União Soviética e os Estados Unidos tinham a obsessão de derrotar um ao outro no espaço, ao ponto que cada um forjou suas conquistas”, diz um texto no site da organização.

A ideia do formato em globo veio bem antes da Nasa. No livro Do Céu, o filósofo grego Aristóteles defendeu a esfericidade da Terra com base nas mudanças de configuração das estrelas dependendo da posição na Terra, na sombra circular de nosso planeta durante eclipses lunares e até na semelhança entre elefantes de regiões distantes. Séculos mais tarde, entre 1519 e 1522, ao circunavegar o planeta, o português Fernão de Magalhães não apenas trouxe um forte argumento ao formato de globo do planeta como também abriu caminho para a descoberta de novas e mais rápidas rotas marítimas. Depois vieram os enunciados pioneiros de Copérnico, Galileu, Kepler e Newton sobre a mecânica de posicionamento dos planetas no Sistema Solar. Newton previu um achatamento da Terra nos polos, além de ter publicado, em 1687, a Lei da Gravitação Universal.

A lei explica a influência gravitacional (a força de atração exercida entre as massas de dois objetos) entre corpos espaciais, como entre a Lua e a Terra e os planetas que compõem o Sistema Solar (orbitando ao redor do Sol). Segundo apontou Newton, dois corpos se atraem segundo uma força que é diretamente proporcional a suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância que os separa.

Já no que diz respeito à evolução, teoria consagrada com a obra de Charles Darwin A Origem das Espécies e contestada pelos criacionistas, evidências apontam para um longo processo adaptativo das espécies – percurso do qual fazem parte os seres humanos. Tal teoria, reforçada por evidências genéticas e geográficas, explica a variedade, adaptação e extinção de milhares de espécies ao longo dos milênios.

 

Mas para os terraplanistas tudo isso é balela. Para espanto de especialistas, não se trata de pouca gente em erro. Uma pesquisa publicada pelo Datafolha revelou que 7% dos brasileiros com mais de 16 anos não creem na esfericidade do nosso planeta, ou seja, 11 milhões de pessoas. É como se toda a população do Rio Grande do Sul estivesse convencida de que pode cair no vazio se tropeçar da borda da Terra. Para complicar, os terraplanistas também conquistaram posições de influência. Até o (agora ex) guru do presidente Jair Bolsonaro e de sua prole, Olavo de Carvalho, demonstrou uma queda pela teoria escalafobética: “Não estudei o assunto da Terra plana. Só assisti a uns vídeos de experimentos que mostram a planicidade das superfícies aquáticas, e não consegui encontrar, até agora, nada que os refute”, escreveu.

Segundo a Sociedade da Terra Plana, os astronautas que foram ao espaço e disseram ter visto que a Terra é redonda podem ter sido subornados ou obrigados a dizer isso. Outra hipótese que levantam é que os astronautas tenham sido iludidos para acreditar na esfericidade.

“A conspiração negacionista prolifera entre os terraplanistas. Como já notado anteriormente o nosso conhecimento sobre a forma da Terra antecede em muito a existência dos astronautas, pois estes surgiram nos anos 60 do século passado. Não teríamos dúvidas sobre a mentira dos astronautas caso eles negassem a esfericidade da Terra. A esfericidade da Terra somente pode ser negada por pessoas ignorantes e/ou religiosos fideístas”, diz o professor Fernando Lang da Silveira. A base ideológica do terraplanismo é uma tacanha forma de fundamentalismo religioso conforme a simples inspeção visual do mapa de Orlando Ferguson (1893) atesta, inspirado em uma interpretação literal da Bíblia com anjos nos quatro cantos da Terra. A loucura é tamanha que para os terraplanistas, o logotipo da ONU seria uma prova de que a terra é plana. Embora vá contra a Ciência, tem que respeitar.