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Até bem pouco tempo desconhecido da maioria dos brasileiros, o nióbio, um metal maleável, brilhante e versátil, frequentou o noticiário e motivou discussões durante uma campanha eleitoral. Mensagens veiculadas nas redes sociais alertavam que as reservas brasileiras do minério, as maiores do planeta, estariam sendo dilapidadas por meio de contrabando ou da venda a preços irrisórios no mercado internacional. O então deputado federal e hoje presidente Jair Bolsonaro, um entusiasta da multifuncionalidade do metal, participou do debate. Em vídeo, enalteceu as virtudes do nióbio, usado como elemento de liga em aços e em aplicações de alta tecnologia, como baterias de carros elétricos, lentes ópticas, aceleradores de partículas, implantes ortopédicos e turbinas aeronáuticas. “Isso pode nos dar independência econômica!”, frisou o agora presidente Bolsonaro. Vale lembrar que o candidato a presidente em 1989, 1994 e 1998, Enéas Carneiro (1938-2007) foi o primeiro a usar o nióbio como trampolim eleitoral. Em 2005, chegou a dizer que, comparado ao roubo do minério, o mensalão era “mesada de trombadinha”.

Dos 118 elementos químicos da tabela periódica, o nióbio está na quinta coluna, entre o zircônio e o molibdênio. De número atômico 41, é classificado como “metal de transição”: em poucas palavras, o minério deixa o aço (ainda) mais forte e resistente. Foi descoberto por Charles Hatchett (1765-1847) em 1801, quando o químico inglês analisava amostras de uma rocha do acervo do Museu Britânico, em Londres. Por ter vindo da Colúmbia Britânica, uma das dez províncias do Canadá, recebeu o nome de columbita. O metal ganhou seu nome definitivo em 1844 e apenas em 1949 foi reconhecido oficialmente como um elemento químico. O minério que ganhou fama durante as eleições não será um salvador da pátria, mas ganhará cada vez mais destaque na indústria global. “O nióbio não tem superpoderes. Sozinho, não vai resolver as mazelas nacionais”, diz o engenheiro de materiais Hugo Sandim, da Escola de Engenharia de Lorena (USP).

Se há dúvidas que o metal pode nos transformar em superpotência, não há dúvidas de que a maior produtora de nióbio em todo o planeta é brasileira; ela pertence a família Moreira Salles, cuja fortuna é estimada em R$ 77 bilhões e controla o negócio desde a década de 1960. A companhia CBMM que produz 80% do nióbio do planeta é avaliada em torno de US$ 13 bilhões. Inegavelmente, as maiores reservas ativas de nióbio, em torno de 98,4%, estão no Brasil. Comendo poeira, Canadá e Austrália aparecem em segundo e terceiro lugares, respectivamente, com modestíssimos 1,11% e 0,46%. “O nióbio não é raro”, diz Eduardo Ribeiro, CEO da CBMM. “Há reservas na Rússia, nos EUA e em países do continente africano. Como o mercado é limitado, ainda não entraram em operação.” Por aqui, a extração é feita por duas empresas. Uma delas é a já citada CBMM, a maior produtora do mundo. A outra é a CMOC Brasil, subsidiária da China Molybdenum (CMOC), que fica em Catalão, a 256 km de Goiânia (GO). “Nossas reservas tornam o Brasil estratégico para o fornecimento desse produto ao mercado mundial”, destaca o geólogo Marcelo Ribeiro Tunes, diretor do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). “A crítica de que vendemos essa riqueza a valores módicos é improcedente. O preço dos produtos de nióbio, entre US$ 40 e US$ 50 o quilograma, reage de acordo com o mercado. Se o preço aumentar de forma irracional e especulativa, os clientes buscarão outras opções.” Para efeito de comparação, a tonelada de minério de ferro vale US$ 90 (ou US$ 0,09 o quilo) e 1 onça de ouro (31,1 gramas) é negociada por US$ 1,3 mil – 1 quilo do metal custa US$ 41,8 mil, cerca de mil vezes o valor do nióbio. E ao contrário do que se diz, não é mais caro que o ouro; o custo de 1 kg de ouro é 1.000 vezes maior que o custo de 1 kg de nióbio.

Os estados de Minas Gerais (cidades de Araxá e Tapira), Amazonas (São Gabriel da Cachoeira e Presidente Figueiredo) e Goiás (Catalão e Ouvidor) são os donos das maiores reservas nacionais. Estudos realizados por especialistas indicam que apenas em Araxá há ao menos 842 milhões de toneladas disponíveis do metal. O que isso quer dizer? É nióbio que não acaba mais! O suficiente para suprir a demanda mundial — que foi de 106 mil toneladas em 2018 — pelos próximos dois séculos. Ou seja, até 2219. Para efeito de comparação, a CBMM produziu 90 mil toneladas de produtos derivados do nióbio no ano passado.

Extraído de uma mina a céu aberto, o minério puro é transformado em produtos acabados como ferronióbio, óxido de nióbio e nióbio metálico. Todos os dias, uma média de 250 toneladas de produtos de nióbio são despachadas para mais de 60 países: nove em cada dez compradores são indústrias que fabricam aço. O metal pode ser encontrado desde o telescópio espacial Hubble ao viaduto francês de Millau, que é suspenso por cabos e considerado o mais alto do planeta, com 343 metros de altura; ou ainda no Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês), o maior acelerador de partículas do mundo e em itens que vão de equipamentos médicos a reatores nucleares, de plataformas de petróleo a turbinas de avião. Ele também é utilizado na construção civil, no setor de óleo e gás, na indústria automotiva e na indústria química.

E a extração ameaça a Amazônia? É provável. “Caso seja feita, é evidente que haverá impactos”, alerta Marcelo Ribeiro a respeito das reservas ainda não exploradas localizadas no Amazonas.

O minério em números

  • 98% das reservas de nióbio em operação estão no Brasil
  • 842,4 milhões de toneladas é a somatória dos depósitos nacionais
  • 8% do aço fabricado no planeta leva ferronióbio
  • A CBMM pode atender a demanda mundial por 200 anos, considerando o mercado atual
  • 120 mil toneladas é a produção anual do metal no mundo
  • O país domina 82% do mercado global